quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Testamento de Francisco de Assis

O “TESTAMENTO” de Francisco de Assis.
Depois da Regra Bulada, o Testamento é o documento melhor e mais amplamente documentado de Francisco. Ninguém duvida de sua autenticidade. Apenas existe uma leve suspeita com os parágrafos 31 a 36.
 O próprio título Testamento procede do texto de Francisco. Sabe-se que Francisco o ditou em seus últimos dias, depois de ter discutido vários pontos com os frades.
Ele queria que fosse lido sempre depois da Regra, e isso sempre foi feito. Mas, desde o início, houve discussões a respeito do valor obrigatório desse documento.
Já o próprio Gregório IX declarou, em 1230, que o Testamento não era obrigatório.
Mas não há dúvida de que ele expressa de maneira muito candente, o pensamento de Francisco sobre a sua própria vida e a que Deus lhe havia inspirado para os Frades Menores.
Vamos estudar com detalhe e na íntegra o Testamento de Francisco:
Sua conversão, arrependimento e sua relação com os leprosos:
1 O Senhor assim deu a mim, Frei Francisco, começar a fazer penitência: porque, como estava em pecados, parecia-me por demais amargo ver os leprosos.
 
2 E o próprio Senhor me levou para o meio deles, e fez ter misericórdia com eles.
3 E afastando-me deles, aquilo que me parecia amargo converteu-se para mim em doçura da alma e do corpo; e depois parei um pouco e saí do século.

Sua oração nas igrejas:
4 E o Senhor me deu tal fé nas igrejas, que assim simplesmente orava e dizia:
5 Nós te adoramos, Senhor Jesus Cristo, também em todas as tuas igrejas, que estão em todo o mundo, e te bendizemos, porque por tua santa cruz remiste o mundo.

Seu amor pelos sacerdotes:
6 Depois o Senhor me deu e dá tanta fé nos sacerdotes, que vivem segundo a forma da santa Igreja Romana, por causa de sua ordem, que, se me fizerem perseguição, quero recorrer a eles mesmos.
7 E se tivesse tanta sabedoria, quanta teve Salomão (cfr. 3Rs 4,30-31), e encontrasse sacerdotes pobrezinhos deste século, nas paróquias onde moram não quero pregar além da sua vontade.
8 E a eles e todos os outros quero temer, amar e honrar como a meus senhores.
9 E não quero considerar pecado neles, porque enxergo neles o Filho de Deus, e são meus senhores.
10 E o faço por isto: porque nada vejo corporalmente neste século do mesmo Filho de Deus, senão o santíssimo Corpo e o seu santíssimo Sangue, que eles recebem e só eles administram aos outros.
11 E esses santíssimos mistérios sobre todas as coisas quero que sejam honrados, venerados e colocados em lugares preciosos.
12 Os santíssimos nomes e suas palavras escritas, onde quer que os encontre em lugares ilícitos, quero recolher e rogo que sejam recolhidos e colocados em lugar honroso.
13 Também a todos os teólogos e aos que nos administram as santíssimas palavras divinas devemos honrar e venerar como a quem nos administra espírito e vida (cfr. Jo 6, 64).

Sua sabedoria e suas palavras
14 E depois que o Senhor me deu frades, ninguém me ensinava o que deveria fazer, mas o próprio Altíssimo me revelou que deveria viver segundo a forma do santo Evangelho.
15 E eu o fiz escrever em poucas palavras e simplesmente, e o senhor papa confirmou para mim.

Os primeiros discípulos:
16 E os que vinham tomar a vida davam aos pobres tudo que podiam ter (Tob 1,3), e estavam contentes com uma única túnica, remendada por dentro e por fora, com o cíngulo e as bragas.
17 E não queríamos ter mais.
18 Os clérigos dizíamos o Ofício segundo os outros clérigos, os leigos diziam: Pai-nosso (Mt 6,9-13); e ficávamos nas igrejas muito de boa vontade.
19 E éramos iletrados e súditos de todos.

Sobre o trabalho:
20 E eu trabalhava com minhas mãos (cfr. At 20,34), e quero firmemente que todos os outros frades trabalhem em trabalho que convém à decência.
21 Os que não sabem, aprendam, não pela cobiça de receber o preço do trabalho mas pelo exemplo e para repelir a ociosidade.
22 E quando não nos derem o preço do trabalho, recorramos à mesa do Senhor, pedindo esmola de porta em porta.

Sua saudação:
23 Uma saudação me revelou o Senhor, que disséssemos: O Senhor te dê a paz (cfr. 2Ts 3,16).

A vida dos frades:
24 Cuidem os frades que de nenhum modo recebam as igrejas, habitações pobrezinhas e tudo que para eles se constrói, se não forem como convém à santa pobreza, que na Regra prometemos, sempre aí se hospedando como forasteiros e peregrinos (cfr. 1Pd 2, 11).
25 Mando firmemente por obediência a todos os frades que, onde quer que estejam, não se atrevam a pedir letra alguma na Cúria Romana, por si ou por pessoa intermediária, nem para alguma igreja ou algum outro lugar, nem por aparência de pregação nem por perseguição de seus corpos;
26 mas onde quer que não forem recebidos, fujam para outra terra, para fazer penitência com a bênção de Deus.

Sobre a Obediencia:
27 E firmemente quero obedecer ao ministro geral desta fraternidade e ao outro guardião que lhe aprouver dar-me.
28 E de tal modo quero estar preso em suas mãos que não possa ir ou fazer mais do que a obediência e a sua vontade, porque é meu senhor.
29 E embora seja simples e enfermo, contudo sempre quero ter um clérigo que me faça o ofício como está contido na Regra.
30 E todos os outros frades tenham que obedecer assim aos seus guardiães e a fazer o ofício segundo a Regra.

O Zelo pela regra: (O seu zelo pela regra o faz intolerante para com a pessoa que não deseja segui-la fielmente. Será que Francisco foi de fato autor destes parágrafos? A princípio ele não queria regras para sua irmandade. Sua regra era somente o Santo Evangelho. Este zelo e esta intolerância levantam suspeitas da autenticidade desta parte do Testamento. Leia-o com atenção.)
31 E os que se descobrisse que não fazem o ofício segundo a Regra, e quisessem variar de outro modo, ou não fossem universais, cristãos (católicos no original), todos os frades, onde quer que estejam, sejam por obediência obrigados a, onde quer que encontrem algum desses, apresentá-lo ao custódio mais próximo desse lugar onde o tiverem encontrado.
32 E o custódio seja firmemente obrigado por obediência a guardá-lo fortemente, como um homem em prisão de dia e de noite, de modo que não possa ser arrancado de suas mãos, até que em sua própria pessoa o apresente nas mãos de seu ministro.
33 E o ministro firmemente esteja obrigado, por obediência a enviá-lo por meio de tais frades, que o guardem de dia e de noite como homem em prisão, até que o apresentem diante do senhor de Óstia, que é o senhor, protetor e corretor de toda a fraternidade.
34 E não digam os frades: "Esta é outra Regra", porque esta é uma recordação, admoestação, exortação e meu testamento, que eu, Frei Francisco, pequenino, faço a vós, meus irmãos benditos, para isto: para que mais cristãmente ( no original catolicamente) observemos a Regra que prometemos ao Senhor.
35 E o ministro geral e todos os outros ministros sejam obrigados por obediência a não acrescentar ou diminuir (cfr. Dt 4,2; 12,32) nestas palavras.
36 E tenham sempre este escrito consigo junto da Regra.

Sobre o uso deste testamento:
37 E em todos os capítulos que fazem, quando lêem a regra, leiam também estas palavras.
38 E a todos os meus frades, clérigos e leigos, mando firmemente por obediência que não ponham glosas na regra em nestas palavras, dizendo: "Assim devem entender-se".
39 Mas assim como o Senhor me deu de dizer e escrever simples e puramente a regra e estas palavras, assim simplesmente e sem glosa as entendais e com santas obras as guardeis até o fim.

Sua Bênção Final:
40 E todo aquele que observar estas coisas, no céu seja repleto da bênção do altíssimo Pai e na terra seja repleto da bênção do seu dileto Filho com o santíssimo Espírito Paráclito e todas as virtudes do céu e todos os santos.
41 E eu, Frei Francisco, pequenino servo vosso, tanto quanto posso vos confirmo por dentro e por fora esta santíssima bênção.