Quando Francisco de Assis ainda vivia no pecado da mocidade, sofreu uma terrível doença.
Prostrado por longa enfermidade, começou a refletir consigo mesmo de maneira diferente.
Já um pouco melhor, e apoiado em um bastão, começou a andar pela casa para recuperar as forças.
Certo dia, saiu à rua e começou a observar com curiosidade a região que o cercava. Mas nem a beleza dos campos, nem o encanto das vinhedos, nem coisa alguma agradável de se ver conseguia satisfazê-lo.
Ficou surpreso com sua mudança repentina e começou a julgar estultos os que amavam essas coisas.
Desde esse dia, começou a ter-se em menos conta e a desprezar as coisas que antes tinha admirado e amado.
Francisco aos poucos voltou ao normal e ainda tentou fugir da mão de Deus e, quase esquecido da correção paterna, diante de uma oportunidade, pensou nas coisas que são do mundo e ignorou o conselho de Deus, prometendo a si mesmo o máximo da glória mundana e da vaidade.
Um homem nobre de Assis não mediu despesas para se armar militarmente e, inchado pela glória vã, decidiu marchar para a Apúlia para ganhar mais dinheiro e honra. Sabendo disso, Francisco, que era leviano e não pouco audaz, alistou-se para ir com ele, porque era menos nobre, mas de ambição maior.
Todo entregue a esse plano e pensando com ardor na partida, certa noite, aquele que o tinha tocado com a vara da justiça visitou-o numa visão noturna, com a doçura da sua graça. E o seduziu e exaltou por causa da glória, porque ele tinha sede de glória.
Pareceu-lhe ver a casa toda cheia de armas: selas, escudos, lanças e outros aparatos. Muito alegre, admirava-se em silêncio, pensando no que seria aquilo. Não estava acostumado a ver essas coisas em sua casa, mas apenas pilhas de fazendas para vender.
E ainda estava aturdido com o acontecimento repentino, quando lhe foi dito que aquelas armas seriam suas e de seus soldados.
Despertando de manhã, levantou-se alegre e, julgando a visão um presságio de grande prosperidade, ficou certo de que sua excursão à Apúlia seria um êxito. Pois não sabia o que dizer e ainda não entendera nada do dom que lhe fora feito pelo céu.
Começou a buscar o Senhor e desejar ser santo.
Certo dia, tendo invocado mais plenamente a misericórdia divina, o Senhor lhe mostrou o que tinha que fazer. Ficou tão cheio de alegria, que não cabia mais em si e, mesmo sem querer, deixou escapar alguma coisa aos ouvidos dos outros. Mas embora não pudesse calar-se por ser tão grande o amor que lhe fora inspirado, era com cautela que comunicava alguma coisa, e falando em parábolas.
Dizia que não queria ir para a Apúlia, mas prometia que haveria de fazer coisas nobres e estupendas em sua própria terra.
Os outros acharam que ele ia se casar e perguntaram: “Você vai se casar, Francisco?”
Respondeu-lhes: “Vou me casar com uma noiva nobre e bonita como vocês nunca viram, que ganha das outras em beleza e supera a todas em sabedoria”.
De fato, a esposa imaculada do Senhor era a verdadeira religião, que ele abraçara, e o tesouro escondido era o reino dos céus, que buscou com tanto entusiasmo.
Pois era necessário que se cumprisse plenamente a vocação evangélica naquele que haveria de ser ministro fiel e autêntico do Evangelho.
Edson e Marisa Sardinha. Baseado em Tomás de Celano, PRIMEIRA VIDA (1CEL), Capítulo 1 e 2.
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