quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Louvor e Adoração na Prática Franciscana




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Louvor e Adoração na Prática Franciscana
Ir. Edson Cortasio Sardinha, OESI/OFSE


Francisco teve uma experiência de conversão extremamente profunda e radical no ano 1204 d.C. durante a uma longa doença. Deus o transformou por inteiro. Transformou todas as áreas de sua vida. Deu-lhe uma gratidão tão intensa que sua vida foi marcada por cânticos de louvor e adoração ao Senhor.
Neste texto vamos ver várias passagens nas primeiras biografias franciscanas que falam de seu estilo de vida de adorador.

Louvor com todas as criaturas
Francisco desenvolveu o louvor como estilo de vida. Sua adoração era tão envolvente que atraia inclusive os animais para bendizer ao Senhor.
Tomás de Celano afirma que havia na Porciúncula, ao lado da cela de Francisco, uma figueira onde uma cigarra “costumava cantar com suavidade”. Certa vez Francisco a chamou dizendo: “Cigarra, minha irmã, vem cá!"  
Como se tivesse razão, ela foi logo para sua mão. E ele: "Canta, minha irmã cigarra, louva com júbilo o Senhor Criador!" Ela obedeceu sem demora, começou a cantar e não parou enquanto o homem de Deus, juntando seus louvores ao cântico, não a mandou de volta para o seu lugar. Lá ficou por oito dias, como se estivesse presa. Quando o Francisco descia de sua cela, tocava-a com as mãos e mandava que cantasse. Ela estava sempre pronta para obedecer-lhe.
Depois Francisco disse aos seus discípulos: “Vamos despedir nossa irmã cigarra, que já nos alegrou bastante aqui com o seu louvor, para que isso não seja causa de vanglória para nós".
Com sua permissão, ela foi embora, e não apareceu mais por lá. Os frades ficavam admiradíssimos, vendo tudo isso[1].  
Francisco louvava a Deus em harmonia com todas as criaturas de Deus.
Bem cedo, na aurora, quando estava em oração, vieram pássaros de diversos tipos para cima da cela onde ficava, não todos juntos, mas primeiro vinha um e cantava, demonstrando o seu doce verso, e depois ia embora. Depois vinha outro, cantava e ia embora; e assim fizeram todos. Francisco ficou muito admirado com isso e teve a maior consolação, mas começou a meditar sobre o que seria isso. E foi dito pelo Senhor em espírito: “Isso é sinal de que o Senhor vai te fazer o bem nessa cela e vai dar-lhe muitas consolações”[2].
            Certa vez, passando por um caminho, levantou os olhos e viu algumas árvores na margem do caminho, sobre as quais estava uma quase infinita multidão de passarinhos; do que Francisco se maravilhou e disse aos companheiros: "Esperai-me aqui no caminho, que vou pregar às minhas irmãs aves". E entrando no campo começou a pregar às aves que estavam no chão; e subitamente as que estavam nas árvores vieram a ele e todas ficaram quietas até que Francisco acabou de pregar; e depois não se partiram enquanto ele não lhes deu a sua bênção. E conforme contou depois Frei Masseo a Frei Tiago de Massa, andando  Francisco entre elas a tocá-las com a capa, nenhuma se moveu. A substancia da prédica de Francisco foi esta: "Minhas irmãs aves, deveis estar muito agradecidas a Deus, vosso Criador, e sempre em toda parte o deveis louvar, porque vos deu liberdade de voar a todos os lugares, vos deu urna veste duplicada e triplicada; também porque reservou vossa semente na Arca de Noé, a fim de que vossa espécie não faltasse ao mundo; ainda mais lhe deveis estar gratas pelo elemento do ar que vos concedeu. Além disto não plantais e não ceifais; e Deus vos alimenta e vos dá os rios e as fontes para beberdes, e vos dá os montes e os vales para vosso refúgio, e as altas arvores para fazerdes vossos ninhos e, porque não sabeis fiar nem coser, Deus vos veste a vós e aos vossos filhinhos; muito vos ama o vosso Criador, pois vos faz tantos benefícios, e portanto guardai-vos, irmãs minhas, do pecado de ingratidão e empregai sempre os meios de louvar a Deus".
Dizendo-lhes Francisco estas palavras, todos e todos estes passarinhos começaram a abrir os bicos, a estender os pescoços, e a abrir as asas, e a reverentemente inclinar as cabeças para o chão, e por seus atos e seus cantos a demonstrar que as palavras lhes deram grandíssima alegria. E Francisco juntamente com elas se rejubilava, se deleitava, se maravilhava muito com tal multidão de pássaros e com a sua belíssima variedade e com a sua atenção e familiaridade[3]
Uma vez, Francisco tinha se retirado para um eremitério, como era seu costume, para escapar da vista e da companhia dos homens. Um falcão que por lá tinha o seu ninho fez com ele um grande pacto de amizade. Sempre cantava para acorda-lo e indicar a hora em que costumava levantar-se para os santos louvores. Francisco gostava muito disso, porque toda essa atenção que o pássaro demonstrava para com ele impedia todo atraso por preguiça. Quando Francisco estava um pouco mais doente que de costume, o falcão o poupava e não vinha dar os sinais das horas de vigília. Como se fosse instruído por Deus, tocava ao amanhecer a campainha de sua voz[4].
Seu estilo de vida era acordar e repousar louvando ao Senhor pelo sol e pelo fogo. Francisco dizia: “De manhã, quando nasce o sol, toda pessoa deveria louvar a Deus que o criou, porque por ele os olhos se iluminam de dia; de tarde, quando cai a noite, toda pessoa deveria louvar a Deus pela outra criatura, o irmão fogo, porque por ele nossos olhos se iluminam de noite. Nós todos somos como que cegos, e o Senhor ilumina nossos olhos por essas duas criaturas. Por isso sempre devemos louvar o glorioso Criador por essas e outras criaturas suas de que usamos todos os dias”[5].

Louvor que traz concórdia
Certa vez usou a arma do louvor para trazer a concórdia entre a liderança da igreja e a liderança civil da cidade de Assis. A Legenda da Perusa narra que quando Francisco jazia doente, tendo já pregado e composto os Louvores, o que então era bispo da cidade de Assis, excomungou o prefeito da cidade. Pois, indignado contra ele, o que era prefeito fez forte e curiosamente preconizar pela cidade de Assis que ninguém vendesse ou comprasse alguma coisa dele, ou fizesse algum contrato; e por isso eles se odiavam muito um ao outro.
O bem-aventurado Francisco, como estava tão doente. Ficou com pena deles, principalmente porque nenhum religioso ou secular se intrometia para cuidar de sua paz e concórdia. E disse a seus companheiros: “É uma grande vergonha para vós, servos de Deus, que o bispo e o prefeito se odeiem desse jeito e nenhuma pessoa entre no meio para cuidar de sua paz e concórdia”. E sim fez um verso nos seus Louvores para aquela ocasião, este: “Louvado sejas, meu Senhor, pelos que perdiam pelo teu amor e suportam enfermidade e tribulação; bem-aventurados os que as suportarem em paz, porque por ti, Altíssimo, serão coroados”.
Depois chamou um de seus companheiros, dizendo-lhe: “Vá dizer de minha parte ao prefeito que ele com os magnatas da cidade e outros, que pode levar consigo, venha ao palácio do bispo”. E quando ele foi disse a outros dois companheiros seus: “Ide também diante do bispo, do prefeito e dos outros que estão com eles e cantai o Cântico de Frei Sol. E confio no Senhor que há de humilhar os corações deles, vão fazer as pazes entre eles e voltaram à antiga amizade e bem-querer”. E quando todos se reuniram na praça do claustro da casa do bispo, levantaram-se aqueles dois frades e um disse: “O bem-aventurado Francisco compôs em sua doença os Louvores do Senhor por suas criaturas, para louvor dele e edificação do próximo. Por isso ele vos roga que as ouçais com grande devoção”. E então começaram a cantar e a dizer-lhes. E imediatamente o prefeito levantou-se, juntou os braços e as mãos com grande devoção, como se fosse o Evangelho do Senhor, e também com lágrimas, ouviu atentamente. Pois tinha muita confiança e devoção por Francisco. Quando acabaram os Louvores do Senhor, o prefeito disse diante de todos: “Na verdade eu vos digo que perdoo não só ao senhor bispo, que preciso ter como meu senhor, mas perdoaria mesmo quem matasse meu irmão ou filho”. E assim se lançou aos pés do senhor bispo, dizendo-lhe: “Eis que estou pronto a satisfazer-vos em tudo, como vos aprouver por amor de nosso Senhor Jesus Cristo e de seu servo Francisco”.
O bispo, tomando-o pelas mãos, levantou-o e lhe disse: “Por meu ofício convinha que eu fosse humilde, mas como sou notavelmente inclinado à ira, é preciso que me perdoes”. E assim com muita bondade e afeição se abraçaram e beijaram”[6].
Francisco buscava o consolo e a reparação da ingratidão através dos louvores a Deus. O Espelho da Perfeição faz a seguinte narração: Levantando-se de madrugada, ele confessou a seus companheiros: "Se o imperador desse um reino inteiro a um de seus companheiros, não deveria este alegrar-se muito com isto? E se lhe desse todo o seu reino não se alegraria ainda mais? Devo desde agora alegrar-me grandemente nas provações e moléstias, encontrar repouso no Senhor e render graças a Deus e a seu Filho único, Jesus Cristo, e ao Espírito Santo, por tal graça que me foi concedida pelo Senhor, que se dignou garantir-me a posse do seu reino, eu, seu indigno servidor, preso ainda a este corpo. Para a sua glória e para a nossa consolação e edificação do próximo, quero compor um novo cântico de louvor às criaturas do Senhor, de quem nos servimos todos os dias e sem as quais não poderíamos viver e com quem o gênero humano ofende sempre a seu Criador. Somos sempre ingratos, em virtude de recebermos tantas graças e benefícios e não louvarmos ao Senhor Criador de todos estes dons, como devíamos". Sentou-se e refletiu durante algum tempo. Depois pôs-se a cantar: "Altíssimo, poderoso e bom Senhor, etc." Compôs a melodia deste cântico e ensinou a seus companheiros para que o recitassem cantando[7].

Pregação e Louvor
A vida de Francisco era cercada de louvor a Deus. Tinha a prática de andar cantando louvores. Boaventura escreveu que “depois de uma longa caminhada, Francisco e seu companheiro chegaram sem dificuldade, cantando hinos e cânticos de louvor, à hospedaria onde deviam ficar”[8].
Seu estilo de evangelização era pregar e cantar ao mesmo tempo. Certa vez ele disse: “Por isso eu quero, para o seu louvor e para nossa consolação e edificação do próximo, fazer um novo Louvor do Senhor por suas criaturas, das quais nos servimos todos os dias e sem as quais não podemos viver. E nas quais o gênero humano ofende muito o Criador, e todos os dias somos ingratos por tão grande graça, porque não louvamos como devemos o nosso Criador e doador de todos os bens”.
E sentando-se começou a meditar e depois a dizer: “Altíssimo, onipotente, bom Senhor”. E compôs um cântico nessas palavras e ensinou seus companheiros a cantá-lo. Pois seu espírito estava em tamanha doçura e consolação, que queria mandar buscar Frei Pacífico, que no século era chamado rei dos versos e foi um mestre muito cortês de cânticos, e dar-lhe alguns frades bons e espirituais, para que fossem pelo mundo pregando e louvando a Deus. Pois queria e dizia que, primeiro, algum deles, que soubesse pregar, pregasse ao povo, e depois da pregação cantassem os Louvores do Senhor como jograis de Deus[9].
Como evangelizava cantando e adorando, se dizia os jograis de Deus. Ele fez a seguinte orientação aos seus discípulos pregadores que dissesse ao povo: “Nós somos os jograis do Senhor e nisto queremos a vossa remuneração, isto é, que estejais no verdadeiro arrependimento”. E dizia: “Que são os servos de Deus senão, de algum modo, uns jograis seus, que devem mover o coração dos homens e levanta-los para a alegria espiritual?”. E especialmente dos frades menores dizia que foram dados ao povo para sua salvação[10].
O ato de cantar ao Senhor era seu estilo de vida. Como amava o Francês, era comum cantar nesta língua. Sua alegria por Cristo era tão intensa que explodia em louvores.
            Tomás de Celano conta que “às vezes, acontecia o seguinte: A suavíssima melodia de seu coração se expressava em palavras que ele cantava em francês. E também era em alegres cânticos franceses que ele extravasava o que Deus lhe tinha murmurado furtivamente ao ouvido. Às vezes - como pude ver com meus próprios olhos - pegava um pedaço de pau no chão, punha-o sobre o braço esquerdo, segurava na direita um arco retesado por um fio, passava-o no pedaço de pau como se fosse um violino e, balançando o corpo com ritmo, cantava ao Senhor em francês.
Frequentemente essa festa toda acabava em lágrimas, e o júbilo se dissolvia na compaixão para com a paixão de Cristo. Então começava a suspirar sem parar, gemendo muito, e logo, esquecido do que tinha nas mãos, era arrebatado ao céu[11].
A Legenda dos Três Companheiros afirma que seus discípulos caminhavam pela Marca de Ancona, exultando de alegria no Senhor, enquanto Francisco, em voz alta e clara, cantava em francês os louvores do Senhor, bendizendo e glorificando a bondade do Altíssimo. Andavam tão alegres como alguém que tivesse encontrado um grande tesouro no campo evangélico da Senhora Pobreza, por cujo amor haviam desprezado, voluntária e generosamente, todas as coisas temporais, considerando-as como esterco[12].

Louvor e Sofrimento
Seu louvor a Deus não estava relacionado às coisas boas da vida. Criou um estilo de adoração que permaneceu até a hora de sua morte. A Legenda de Perusa narra que Francisco, mesmo sofrendo muito pelas enfermidades, louvou ao Senhor com grande fervor do espírito e alegria do corpo e da alma. Na hora da morte ele disse: “Então, se devo morrer logo, chamai-me Frei Ângelo e Frei Leão, para que me cantem sobre a irmã morte”.
Esses frades se apresentaram diante dele e cantaram com muitas lágrimas o Cântico de Frei Sol e das outras criaturas ao Senhor, que o próprio Francisco fizera em sua doença para louvar o Senhor e para consolar sua alma e a dos outros, no qual canto colocou antes do último um verso sobre a irmã morte, a saber: “Louvado sejas meu Senhor, por nossa irmã a morte corporal da qual nenhum homem vivo pode escapar. Ai de quem morrer em pecado mortal. Felizes os que ela encontrar em tuas santíssimas vontades, porque a morte segunda não lhes fará mal”[13].
Nada podia retirar o louvor a Deus de seus lábios. Louvava a Deus inclusive na enfermidade.
            A Legenda de Perusa diz que “em sua saúde e enfermidade fez e fazia de boa vontade louvar o Senhor e também animava os outros a isso. Mesmo quando estava sofrendo pela doença, começava ele mesmo a dizer os Louvores do Senhor, e depois fazia que seus companheiros cantassem para que, em consideração do louvor do Senhor, pudesse ser esquecida a atrocidade das dores e doenças. E assim fez até o dia de sua morte”[14].
            Francisco acreditava que os cânticos ao Senhor trazia alívio para as aflições. Depois que compôs o Cântico das Criaturas, compôs também alguns cânticos para consolação e edificação das Pobres Damas, pois sabia-as muito aflitas com suas enfermidades[15] .
Nunca parou de cantar ao Senhor, mesmo diante de tribulações e ladrões. Boaventura diz que “desprezando o mundo, livre das cobiças mundanas, deixou sua cidade natal, alegre e despreocupado. No meio da floresta, cantava ele em francês os louvores do Senhor, quando apareceram alguns ladrões. O arauto do Grande Rei, sem nenhum medo, continuou seu canto. Viajante seminu e desprovido de tudo, encontrava sua alegria, tal como o Apóstolo, nas tribulações.[16]            Para muitas pessoas, era um escândalo Francisco cantar na hora da dor e da morte. Alguns dias antes de sua morte, esteve doente em Assis no palácio do Bispo, com alguns de seus companheiros. Apesar de toda a sua doença, ele cantava muitas vezes certos louvores de Cristo. Um dia, disse-lhe um de seus companheiros: “Pai, tu sabes que estes cidadãos têm grande fé em ti e te julgam um santo homem. Por isso podem pensar que, se tu és quem eles creem, deverias, nesta enfermidade, pensar na morte e antes chorar que cantar, pois estás tão doente. E acha que o teu cantar e o nosso, que nos fazes fazer, é ouvido por muita gente do palácio e de fora, porque por ti este palácio está cercado por muitos homens armados que, com isso, poderiam ter um mau exemplo. Por isso eu acho, disse o frade, “que tu farias bem sair daqui e que nós voltássemos todos para Santa Maria dos Anjos, pois não estamos bem aqui, entre seculares”[17] .
Seu exemplo foi seguido pela multidão no dia de sua morte. Tomás de Celano informa que quando Francisco morreu, na manhã seguinte, juntou-se a multidão de Assis com todo o clero e, carregando seu corpo do lugar onde morrera, levaram-no para a cidade entre hinos e louvores, tocando trombetas. Cada um levava um ramo de oliveira ou de outras árvores e seguiam solenemente o enterro, com muitas luminárias e cantando louvores em alta voz[18].

Louvor no Natal do Senhor     
O Natal era para Francisco um tempo de louvores ao Deus que se fez pobre e veio habitar em uma manjedoura.
            Três anos antes de sua morte, resolveu celebrar com a maior solenidade possível, perto de Greccio, a memória da Natividade do Menino Jesus, a fim de aumentar a devoção dos habitantes. Francisco mandou pois preparar um presépio e trazer muito feno, juntamente com um burrinho e um boi, dispondo tudo ordenadamente; reuniram-se os irmãos chamados dos diversos lugares; acorreu o povo, ressoaram vozes de júbilo por toda parte e a multidão de luzes e archotes resplandecentes juntamente com os cânticos sonoros que brotavam dos peitos simples e piedosos transformaram aquela noite num dia claro, esplêndido e festivo. E Francisco lá estava diante do rústico presépio em êxtase, banhado de lágrimas e cheio de gozo celestial. Principiou então a missa solene, na qual Francisco, que oficiava como diácono, cantou o Evangelho. Pregou em seguida ao povo e falou-lhe do nascimento do Rei pobre a quem ele chamava com ternura e amor de Menino de Belém[19] .
           
Louvor e dependência completa do Senhor
Francisco louvava a Deus por poder ter aprendido a depender unicamente dele. Este era o seu entendimento da pobreza. Poder depender somente de Deus.
Unido à senhora pobreza por um vínculo indissolúvel, esperava seu dote futuro, não o presente. Cantava com maior fervor e alegria os Salmos que falam da pobreza como: "Não ficará o pobre em eterno esquecimento", e "Olhai, pobres, e alegrai-vos"[20].
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Cântico das Criaturas
Eis o "Cântico das Criaturas" que Francisco compôs quando o Senhor lhe assegurou que entraria no seu reino:
Altíssimo, onipotente, bom Senhor, Teus são o louvor, a glória, a honra E toda a bênção. Só a ti, Altíssimo, são devidos; E homem algum é digno De te mencionar.
Louvado sejas, meu Senhor, Com todas as tuas criaturas, Especialmente o senhor irmão Sol Que clareia o dia E com sua 'luz nos alumia. E ele é belo e radiante Com grande esplendor: De ti, Altíssimo, é a imagem.
Louvado sejas, meu Senhor, Pela irmã Lua e as estrelas Que no céu formaste claras E preciosas e belas.
Louvado sejas, meu Senhor, Pelo irmão Vento, Pelo ar, ou nublado Ou sereno, e todo o tempo Pelo qual às tuas criaturas dás sustento.
Louvado sejas, meu Senhor, Pela irmã Água Que é mui útil e humilde E preciosa e casta.
Louvado sejas, meu Senhor, Pelo irmão Fogo Pelo qual iluminas a noite. E ele é belo e jucundo E vigoroso e forte.
Louvado sejas, meu Senhor, Por nossa irmã a mãe Terra Que nos sustenta e governa, E produz frutos diversos E coloridas flores e ervas.
Louvado sejas, meu Senhor, Pelos que perdoam por teu amor, E suportam enfermidades e tribulações. Bem-aventurados os que as sustentam em paz, Que por ti, Altíssimo, serão coroados.
Louvado sejas, meu Senhor, Por nossa irmã a Morte corporal, Da qual homem algum pode escapar. Ai dos que morrerem em pecado mortal! Felizes os que ela achar Conformes à tua santíssima vontade, Porque a morte segunda não lhes fará mal!
Louvai e bendizei a meu Senhor, E dai-lhe graças, E servi-o com grande humildade[21].
Francisco chamava todas as criaturas de irmãs, intuindo seus segredos de maneira especial, por ninguém experimentada, porque na verdade parecia já estar gozando a liberdade gloriosa dos filhos de Deus. Na certa, ó bom Jesus, ele que na terra cantava o vosso amor a todas as criaturas, estará agora a louvar-vos nos céus com os anjos porque sois admirável[22].

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[1]  Tratados dos Milagres – Tomás de Celano, 27.
[2] Legenda de Perusa, 118.
[3] Os Fioretti de Francisco de Assis, 16.
[4] Tomás de Celano – Segunda Vida, 12.
[5]Legenda da Perusa, 83.
[6] Legenda da Perusa, 84.
[7] Espelho da Perfeição, 100.
[8] Boaventura Legenda Menor, 9.
[9] Legenda de Perusa, 83.
[10] Legenda da Perusa, 83.
[11] Tomás de Celano Segunda Vida, 90.

[12] Legenda dos Três Companheiros, 9.33
[13] Legenda de Perusa, 7.
[14] Legenda da Perusa, 83
[15] Espelho da Perfeição, 90.
[16] Boaventura Legenda Menor. Capitulo 1. 8.
[17] Dos Estigmas de São Francisco, 5.
[18] Tomás de Celano – Primeira Vida, 10.
[19] Boaventura – Legenda Maior, 10.
[20] Tomas de Celano – Segunda Vida, 40.
[21] Espelho da Perfeição, 120.
[22] Tomás de Celano – Segunda Vida, 29.


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